Coluna de Mariana Benedito – Localiza aí no GPS!


“Vivemos uma vida nos baseando e tentando nos alicerçar nas mentiras que contamos para nós mesmos”


Será que o GPS, o localizador, o Google Maps, o Google Earth, ou qualquer uma dessas ferramentas de localização no espaço utilizadas pela NASA, é capaz de nos mostrar para onde vai o que queremos fazer e não fazemos? Para onde vai aquilo que queremos dizer e não dizemos? Para onde vai aquilo que a gente não se permite sentir? Para onde vai tudo aquilo que a gente engole por medo da não aprovação, por vergonha, porque a mente grita que seremos rejeitados?

Imagino que a grande maioria da população desse planeta chamado Terra gostaria que as palavras não ditas e as emoções represadas morressem no túmulo do silêncio, fossem simplesmente esquecidas e nunca mais a sombra ou fantasma delas viesse nos assombrar; mas lamento informar, meu amadíssimo leitor, aquilo que não dizemos se acumula em nosso corpo, enche a alma de gritos mudos, se transforma em noites sem dormir, nós apertados na garganta, dúvida, tristeza, frustração. As emoções que a gente acha que esconde no fundo do tapetinho se transformam em sensação física, dor, incômodo, doença. Bate, volta e meia, aquele vazio interno que nada preenche! Aquele grito mudo inquietante e ensurdecedor!

Que essa nova era nos trouxe a plasticidade, instantaneidade e a pressa, isso é fato e estamos carecas de saber. Todo mundo quer estar bem, se mostrar bem; grande parte quer se melhorar e se curar, mas quer na superfície. Muitos temem mexer nas feridas por medo da dor que elas causam. Vivemos uma vida nos baseando e tentando nos alicerçar nas mentiras que contamos para nós mesmos e, como diria Clarice Lispector, nunca sabemos qual o defeito que sustenta o nosso edifício inteiro.

O medo está sempre protegendo alguma coisa, algum incômodo, algo que foi jogado para o fundo da gaveta. Olhar de frente para o medo, a ponto de compreender o quê ele está guardando, escondendo, preservando, é o primeiro passo para a integração. Para tornar-se inteiro, verdadeiramente presente e equilibradamente consciente. Mas a gente tem medo de abrir essa porta, porque é justamente ao adentrar nesse quarto escuro que a gente entra em contato com as dores que geraram essa defesa, que criaram na gente toda essa armadura. É uma bola de neve, não é?

É preciso sentir na pele essa emoção – à la Monange. Olhar nos olhos dela. Àquilo que você resiste, persiste! Já diria o bom, velho e incrível Jung.

É fácil? Não mesmo! É profundamente doloroso, porque a gente passa uma vida, 30, 40, 50, 70 anos escondendo da gente mesmo todos esses incômodos, medos, dores. Pense você passar a vida inteira seguindo os dias de forma automática, sendo guiado pelas construções e interpretações, na maioria das vezes equivocadas, que a sua mente grita. E ir, dia após dia, fortalecendo cada vez mais essa estrutura que foi construída em terreno tão frágil e, de repente, se dar conta disso tudo. É assustador! Mas é libertador também. Porque a gente se dá o direito e o presente de ir lapidando, melhorando, ganhando autonomia e sendo guiado, verdadeiramente, pela própria consciência.

A gente se enche de todas as defesas possíveis e inimagináveis para não sentir. Mas espirra no outro nosso incômodo, reage e enxerga as situações externas como reflexo do interno, não tem para onde correr. Fim da linha. Final da rota.

Os conflitos continuam onde quer que a gente esteja, até que o único caminho seja trilhado.

Para dentro!

E esse não aparece no GPS.

 

* Psicanalista em formação; MBA Executivo em Negócios; Pós-Graduada em Administração Mercadológica; Consultora de Projetos da AM3–Consultoria e Assessoria.

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