Itabuna, ontem e hoje



 

Na data em que festejamos a elevação do então Arraial de Tabocas à condição de município e cidade de Itabuna, ocorrido a 28 de julho de 1910, vamos fazer um pequeno passeio pelo passado, procurando entender as transformações vividas pela cidade nesses 107 anos, avivando a memória dos mais velhos e mostrando, aos mais jovens, o que foi e o que é a nossa Itabuna. Vou me reportar aos últimos 70 anos, começando na década de quarenta até os dias presentes, utilizando, principalmente, dos fatos guardados na memória e do que foi publicado pelos nossos historiadores Manoel Bonfim Fogueira, Oscar Ribeiro Gonçalves, José Dantas de Andrade, Adelino Kfoury Silveira e outros que têm se dedicado a esmiuçar a história e estórias deste pedaço do território baiano.

Hoje nos deparamos com quase 100 bairros quando, na década de quarenta ,podíamos contar nos dedos e citar o centro da cidade e os bairros de Taboquinhas, Pontalzinho, Lava-Pés, Berilo, Mangabinha, Burundanga, Bananeiras, Abissínia, Pau Caído, Alto Maron; a cidade crescia e já se notava que novos bairros estavam nascendo, como Fátima, Banco Raso, Vila Zara, Fuminho e o crescimento se fazia em direção às estradas para Pirangi, Ilhéus, Palestina e, às margens direita do Cachoeira local onde, Félix Severino do Amor Divino ergueu o primeiro casebre do futuro povoado, hoje a pujante Itabuna.

Apenas o centro da cidade tinha as ruas calçadas a paralelepípedo e recebia água encanada; essas benesses do progresso demoraram para chegar aos bairros. A energia elétrica era fornecida por dois possantes motores a diesel, localizados na usina do Cajueiro,que eram desligados por volta das 22 horas e religados na manhã do dia seguinte; os moradores usavam os “fifós”, candeeiros e, os mais abastados, os potentes Aladim. No final da década de 50 chegou a energia do Funil e o fornecimento foi regularizado. Fato interessante e muito lamentado ocorreu em plena copa do mundo de 1954, quando houve um incêndio na Usina do Cajueiro e ficamos mais de um mês sem energia elétrica; poucas residências dispunham de geladeira.

Sem dúvida alguma o porto de Ilhéus era o principal local de entrada de mercadorias e novidades vindas de outros estados, principalmente do sul e sudeste e, também, do exterior; de Ilhéus para cá, utilizava-se o transporte rodoviário e o ferroviário; é bom lembrar que a estrada de ferro começou a funcionar no ano de 1913 e a estrada de rodagem inaugurada em 1928.

Até os anos cinquenta, o município de Itabuna era grande e ia até Itapuí, hoje Itororó, e as marinetes da Companhia Viação Sul Baiano (SULBA) ligavam a cidade a alguns de seus distritos, principalmente os mais prósperos como Macuco (Buerarema), Itaúna (Itapé), Palestina (Ibicaraí). Também havia linhas para Ilhéus e outras localidades da região.

Ouviam-se as notícias do Brasil e do mundo pelo rádio e as ondas mais sintonizadas eram de rádios do Rio de Janeiro, então capital da república, secundados por rádios de Salvador e de São Paulo; na região cacaueira, não se perdia o Repórter Esso, na voz possante de Heron Domingues, principalmente o do horário das 20:25 hs. quando era noticiado o preço do cacau na bolsa de Nova York; preço alto do cacau, festas e sorrisos; preço baixo, desânimo e tristeza; os cacauais eram atacados pelo “mela” mas, a “vassoura-de-bruxa” ainda não havia sido trazida para cá. O rádio teve um papel importantíssimo na difusão das coisas do Brasil e, para os mais novos, que não alcançaram essa época de ouro, fica a explicação da grande torcida que, até hoje, os clubes de futebol carioca desfrutam; nos meus doze anos, ouvido colado ao rádio, comecei a sofrer com o meu Vasco da Gama,principalmente quando jogava com um certo time da Gávea; ainda tenho a impressão de ouvir a narração de Jorge Cury e Antonio Cordeiro.

Nos anos cinquenta, a organização dos Diários e Emissoras Associadas, do paraibano Assis Chateaubriand, dominava o país e tinha prestígio semelhante ao que tem, hoje, a Rede Globo ou, talvez mais; a sua mais importante publicação era a revista semanal o Cruzeiro, com os melhores articulistas do país e o impagável ‘Amigo da Onça”; os leitores aguardavam, ansiosos, a piada e as artimanhas dessa criação do artista Péricles.

A década de cinquenta foi uma década de ouro, para o Brasil e para Itabuna; duas  novas pontes foram construídas sobre o Cachoeira; ampliou-se o leque de educação na cidade; novos cinemas foram inaugurados e, também, a primeira estação de rádio, a Radio Club de Itabuna; foi reativado o velho estádio da LIDA, recomeçando o campeonato de futebol local; clubes do Rio, Salvador e Recife vieram se apresentar em nossa cidade; o primeiro deles foi o Botafogo, trazendo Nilton Santos, Garrincha, Quarentinha, Pampolini e outros bambas; a seleção de Itabuna ganhou um importante torneio intermunicipal,sangrando-se campeão nos gramados da Fonte Nova.

A juventude esbanjava alegria e vigor nas festas do Grapiúna e do Itabuna, principalmente no Carnaval; festas de estudantes, com quermesses, paquera e várias brincadeiras; às tardes e nas noites cálidas, o “footing” no jardim da Praça Olinto Leone, a conhecida praça da Prefeitura, com uma amurada ao lado do rio, onde muitos namoros começaram; isso quando não ocorria alguma vaca, ou boi, desgarrar-se do grupo, que se dirigia ao matadouro local, onde hoje situa-se o IMEAM, causando um tremendo alvoroço; correria para todos os lados e, certa vez, uma rês desgarrada chegou a entrar no pátio da Ação Fraternal; lojas eram fechadas até que um garboso vaqueiro dominava o animal e o trazia de volta ao redil.

Muito teria a contar sobre esses anos de ouro em que a violência beirava o zero; o tóxico era” coisa de se ouvir falar”; o núcleo familiar ainda não sofrera tantas dilacerações e o romantismo imperava; os jovens namoravam; alguns noivavam e casavam; respeitava-se pai e mãe e os políticos não eram tão corruptos; claro que não tínhamos as facilidades de hoje; a televisão dava os primeiros passos e não se imaginava que apareceriam a internet e o celular. Esses tempos eram melhores que os de hoje? Não sei, deixo a resposta com o (a) prezado (a) leitor (a).

E assim chegamos aos 107 anos do velho Arraial de Tabocas, hoje a nossa Itabuna, cidade das mais importantes do nordeste brasileiro; a vassoura-de-bruxa” expulsou muita gente da zona rural para a urbana e, a nossa Itabuna, também experimentou esse aumento inesperado e não planejado de sua população; bairros surgiram e, com eles, problemas de vários tamanhos. Fica, para os governantes, a argúcia e a vontade de resolver as demandas surgidas dessa inversão populacional. Mas, a história de qualquer comunidade, é escrita por todos que aí vivem; cada um coloca o seu tijolinho e vai erguendo esse edifício maravilhoso e complexo que se chama cidade. Parabéns Itabuna.

João Otavio Macedo.