Itabuna vai guardar mais uma enxurrada de emoção com “Paixão de Cristo”


Espetáculo, sob direção de Marco Nô, tem novo local de apresentação na Sexta-feira Santa, a partir das 19 horas


Um novo olhar para recontar a história de Jesus e Maria

A milenar história da morte e ressurreição de Jesus, que arrasta para um mergulho de sentimentos, será novamente encenada em Itabuna. Mas haverá uma série de novidades, a começar pelo caráter itinerante. Dividida em três atos, a peça terá como palcos três locações no centro da cidade, a partir das 19 horas da Sexta-feira Santa, dia 19 de abril. O diretor Marco Nô, que conduz esse teatro vivo na memória coletiva, atua neste trabalho pelo sétimo ano. O Diário Bahia pôde assistir a um ensaio e sentir um pouco do que está sendo preparado.

Dono de uma criatividade e necessidade de inovação a toda prova, ele optou pela ousadia de a “Paixão de Cristo” ser narrada a partir do olhar de Maria – o que inclui jogar no foco as dores e reflexões de uma mãe a ver a morte do filho. “É muito mais forte contar a história do próprio filho, que foi crucificado. Está muito forte, muito bonito!”, comenta, animado, Nô. Ele acrescenta que chegou a este formato adaptando narrações do livro do profeta Isaías.

Sobre o trajeto que escolheu para recontar essa história, Marquinho Nô adiantou que a primeira estação será num palco montado na Praça Camacan. Em seguida, uma segunda parte ocorre como um verdadeiro cortejo, onde atores e plateia sobem juntos, vivendo aquela enxurrada de emoção. Ao final, chegam ao local do terceiro e último ato, com a crucificação – na praça da Catedral de São José.

“Essa é a parte mais esperada, uma crescente, em que o público chora”, acrescenta o diretor, que busca, a cada ano, uma forma nova de retratar o sofrimento de Jesus Cristo. Ele aposta numa participação direta da população em todas as partes do espetáculo.

De mãe pra filho

Espetáculo mostra qualidade do teatro em Itabuna

O papel de Maria será, novamente, interpretado pela atriz Larissa Profeta. Ela, por sinal, até encontra, no personagem, semelhanças com tantas mães da cidade que estejam perdendo filhos assassinados. “É uma construção muito humana, eu costumo dizer. Mostra o lado humano de Maria, da mãe que sofre, sente a dor de perder seu filho da forma que ela perde. Acho que Maria contando a história foi a sacada de Nô; não teria uma pessoa melhor pra contar a história de Jesus do que a própria mãe dele. Pra um trabalho de ator, essa história tem um quê de diferente. Porque pega o lado espiritual mesmo ”, afirma a artista.

Também é sempre bastante esperada a figura daquele que dá vida ao protagonista Jesus Cristo, com todas as agruras e lições dEle. Há 13 anos, quem tem a missão de interpretar o tão inspirador mestre de gerações é o ator Alex Francis. Ele personifica a voz, os gestos e toda a carga atribuídos à figura mais popular do mundo cristão. E comenta sobre o novo prisma que guiará o caminho da encenação.

“É uma renovação; as pessoas geralmente ouvem falar do evangelho de Pedro, de Mateus… e não tem essa visão no olhar de Maria, que passou por todo o processo juntamente com os apóstolos. Nada melhor do que uma mãe contar a história do seu filho; é uma responsabilidade implícita, de uma fundamental força na história. Me sinto até honrado e a responsabilidade dobra a cada ano. Sinto estar descobrindo algo novo a cada ano, não só aqui na peça. Porque o ensinamento de Jesus é para a vida. O verdadeiro evangelho dEle é o amor”, avalia o ator, dono de uma interpretação que, de fato, deixa a plateia boquiaberta.

No bojo da interpretação, cada ator e/ou figurante (muitos deles de forma voluntária) está engajado com o projeto e procura agir da forma mais inteira possível. É o caso de João Ataya, que participa da peça pelo sétimo ano, e representará um fariseu. “A intenção é analisar a conduta de Jesus Cristo, para poder encaminhar ao julgamento. Estou feliz de interpretar o personagem e procurando dar o meu melhor, para que o público seja impactado”, planeja.

Também escalado junto ao elenco pela quinta vez, o funcionário público Zem Costa dará novamente vida a Pedro, a quem Jesus Cristo confiou o papel de fundar a igreja. “É uma honra a oportunidade que o diretor me deu, mais uma vez, de fazer o apóstolo Pedro, um dos principais da peça. Estou tentando dar o melhor de mim; porque, como o próprio texto diz, é uma história de amor e fé”, declara.

Eva Lima e Marco Nô: 35 anos de dedicação à arte de interpretar

Décadas de trajetória

Tanto o diretor Marco Nô como a atriz Eva Lima ultrapassam a marca dos 35 anos de carreira e, neste trabalho especificamente, compartilham a preparação para que a FICC (Fundação Itabunense de Cultura e Cidadania) realize uma “Paixão de Cristo” em alto nível. Apesar de contarem com um orçamento cerca de três vezes menor que o de 2017 (último ano em que esta equipe esteve à frente).

Eva Lima, com o olhar de quem já interpretou o papel de Maria três vezes e está encarregada da produção de elenco, atentamente constata a qualidade dos atores envolvidos e do colega diretor. Ela também tem clara a dimensão dessa peça, cuja qualidade já situou Itabuna no calendário do turismo religioso na Bahia. “É um momento de ‘lavar a alma’, buscar ver coisas que não vimos nos outros dias do ano”, diz, sobre os sentimentos fomentados em quem assiste e quem trabalha no contexto.

Embora ressalve: “Tivemos que fazer cortes de cenas para adaptar ao orçamento, resolver de forma que não comprometa e todo mundo foi chamado para ser voluntário. Temos voluntários até entre os atores, que foram atraídos pelo nome do diretor Marquinho Nô”. Com a afirmação, aliás, a atriz deu uma ideia do quão coletiva está sendo a construção de mais uma representação da “Paixão de Cristo” em Itabuna.

O grupo de 70 a 80 atores envolvidos neste espetáculo vem de várias cidades. Além de Itabuna, Ilhéus, Itapé, Itajuípe, Buerarema, Camacan e Cariacica-ES (a exemplo de Hudson Braga). “A gente é movido pela arte. Por mais difícil que seja, a gente não foge da raia”, acrescenta Eva, como se estivesse repetindo um “mantra” capaz de engajar toda a equipe.