Mariana Benedito*
Essa semana foi comemorado o Dia dos Namorados, e toda essa atmosfera de relacionamentos me levou, particularmente, a uma reflexão do por que buscamos nos relacionar, o quê nos leva a criar e estabelecer vínculos afetivos. O maior anseio, desejo, aspiração de todos nós – meros mortais – é sermos amados. A sensação de acolhimento, aceitação, adequação, pertencimento vem para nos nortear e orientar onde nos sentiremos amados. E é justamente essa busca que nos motiva a estabelecer relacionamentos afetivos, amorosos. A necessidade de preenchimento, com algo externo, de uma lacuna e falta que é interna; e que nos leva, muitas vezes, a projetar no outro nossos desejos e idealizações, desencadeando as cobranças e o pensamento de que o outro é responsável pela nossa felicidade.
Mas a sociedade nos cobra essa felicidade. Uma felicidade que é pautada de acordo com os parâmetros e regras pré-estabelecidos, uma receita de bolo, um único caminho. Para sermos aceitos e adequados, é preciso que tenhamos uma carreira profissional na área que é designada como satisfatória, um relacionamento afetivo nos moldes, rótulos e caixas que nos são determinados. E essa cobrança aumenta ainda mais quando se trata de Redes Sociais, em que a felicidade exacerbada, livre de dores, dias ruins, desentendimentos, medos, mágoas é amplamente exaltada. Tomamos, muitas vezes, como verdade e objetivo a ser alcançado o modo de vida do outro, as viagens que faz, os relacionamentos que tem, os ambientes que frequenta: tomamos a parte pelo todo. É uma necessidade de mostrar-se bem o tempo inteiro, que acaba por – de forma altamente velada – estabelecer como regra a exposição.
Muito se é discutido, seja nas rodas de conversa com amigos ou mesmo em estudos especializados, até que ponto é saudável e benéfico para um relacionamento a exposição, que se intensifica em datas comemorativas, como é o caso do Dia dos Namorados. Mas o ponto em quero chegar, querido leitor, é a veracidade e motivação dessa exposição. Lembro-me de uma situação que ficou marcada em minha memória e se encaixa perfeitamente para exemplificar esta linha tênue entre o que é vivido e o que é mostrado. Estava num restaurante e, em frente à mesa em que eu estava, tinha um casal que havia se desentendido e conversado de uma maneira mais acalorada. Até aí, nada muito fora do comum. O que me chamou a atenção foi o fato de que, passado algum tempo, mesmo com eles visivelmente distanciados, a moça pegou seu celular, se aproximou do parceiro, os dois sorriram, tiraram um selfie e, instantaneamente após os sorrisos para a foto, os semblantes voltaram a ficar fechados e eles se distanciaram novamente.
Uma foto postada, num ambiente conhecido, com alguém do lado; mas absolutamente uma felicidade fakeada. Será que nos relacionamos pelo bem que nos faz estar com o outro ou para mostrar que temos um relacionamento?
Quando nos relacionamos – e isso perpassa relação familiar, de trabalho, de amizade – muitos aspectos de nossa personalidade vêm à tona. Especialmente em relacionamentos amorosos, nossas idealizações, expectativas, posturas e fantasias dizem muito mais sobre nós e nossos medos, mágoas, dores e cicatrizes do que daquela pessoa que está ao nosso lado. O mestre espiritual Sri Prem Baba diz que se a vida é uma escola, os relacionamentos são a universidade; já que é através deles que nos reconhecemos, percebemos nossas lacunas ao exigirmos amor, carinho, afeto, atenção. É através dos relacionamentos que dimensionamos o quanto que estamos afastados de nós mesmos ao colocar nossa felicidade nas mãos de outra pessoa, o quanto nos vitimizamos e colocamos o outro como algoz. É através dos relacionamentos que identificamos o quanto ainda somos movidos pela carência, pelo ego, pela vaidade, pelo medo.
Não, não estou dizendo que se relacionar é ruim! De maneira alguma. Muito pelo contrário. Se relacionar, com consciência, é uma oportunidade imensa de observação e autoconhecimento. E só podemos dar aquilo que temos: quanto mais amor tivermos por nós e nossos processos, quanto mais percepção de nossas lacunas, mais inteiros estaremos para qualquer tipo de relação.
A grande questão não é ser completado, preenchido. É ser transbordado!
* Psicanalista em formação; MBA Executivo em Negócios; Pós-Graduada em Administração Mercadológica; Consultora de Projetos da AM3–Consultoria e Assessoria.
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