A vida correndo entre os dedos



Você já mergulhou as mãos no mar, retirou-as e ficou olhando a água escorrer entre os dedos até sumir de todo? Pois é assim que me sinto, quando começo a pensar sobre a minha vida que corre. Um fluxo de lembranças se precipita na memória, sem que eu possa detê-las, como se fossem água vazando. Em pouco tempo, só tenho as mãos vazias, embora ainda molhadas. O meu passado logo se esvai na mente e fico apenas com a sombra de algo que passou, se foi e não mais existe, embora os olhos ainda estejam molhados do que vivi.  Some a água e ficam os dedos; vão-se as lembranças e fico eu, em silêncio, remoendo a mim mesmo. No fim de tudo, apenas a alma cega se procurando no escuro. A vida é assim, contínua, sem pausa, nem mesmo para que você se recomponha e possa continuar a viver. A vida é uma única partida de futebol, sem intervalo nem segundo tempo. Você só pode pensar na vida, vivendo-a, sem lhe pedir um tempo. O tempo é da vida, não pertence a você. Se ela lhe der um tempo, mesmo para pensar nela, é da vida que você o está tirando. Tudo o que a gente viveu é água que passou por nós, escorreu e sumiu. A memória é como uma peneira que mergulha nas lembranças, sem, no entanto, poder trazê-las de volta. Ao fim de cada segundo, tudo se transforma em passado, em lembranças, e você é obrigado a continuar vivendo, ainda que não saiba o que é sua vida. A única coisa que você pode fazer é viver. Arranje alguma crença, uma fantasia bonita como a de Papai Noel.  Ela  não vai lhe explica a vida, mas pode ajudá-lo a sobreviver. Para saber quem é você, não interrogue o passado, que você lembra, nem o futuro, que você não conhece. Você é unicamente espanto e dúvida. Viva assim…