A saudade…



            Saudade é sempre sentir a falta? Saudade é algo impreterivelmente bom? Saudade se confunde com melancolia? Não sei. São muitas as perguntas… Por ora, permita-me, por favor, uma modesta reflexão a respeito: sinto que sentir saudade faz parte de uma reavaliação pessoal (intrapessoal) do que já vivemos ou fizemos, e mesmo do que ainda viveremos ou faremos. Há ainda a possibilidade de sentirmos saudade daquilo que deixamos de fazer.

Esse sentimento e essa reavaliação podem nos ajudar no processo de amadurecimento, ou melhor, no nosso processo de humanização. A saudade vai além da ausência de um ou mais ente querido: podemos sentir saudade por uma ou mais pessoas, por um ou vários animais, por um ou muitos objetos e etc. E essa saudade pode contribuir para abrandar nosso vazio existencial.

A saudade pode se fundir a outros sentimentos. Muitos e diversos sentimentos. Foi como bem disse o cantor e compositor Antonio Carlos Jobim (1927/1994) em “Wave”, uma de suas belíssimas canções: “vou te contar, os olhos já não podem ver, coisas que só o coração pode entender. Fundamental é mesmo o amor. É impossível ser feliz sozinho”.

Sentimos saudades de forma diferentes. E é difícil dizer o motivo (ou os motivos) de como nos sentirmos quando sentimos saudades. Explicar a saudade é sempre um embaraço. O poeta português Fernando Pessoa (1888/1935) percebeu essa dificuldade: “Saudades, só portugueses conseguem senti-las bem. Porque têm essa palavra, para dizer que as têm”.

E muito mais nos disse o genial poeta lusitano: “Eu amo tudo o que foi. Tudo o que já não é. A dor que já me não dói. A antiga e errônea fé. O ontem que a dor deixou. O que deixou alegria, só porque foi, e voou. E hoje já é outro dia”.

É dificílimo dizer sobre a alegria, a felicidade, a esperança. Sobre a saudade é complicadíssimo! Precisamos ter muita paciência, porque a cada instante que refletimos sobre ela, de repente, zapt!, a saudade muda de forma, de jeito e de conceito. Por isso fui ao Dicionário. Vejamos: “1. sentimento de mágoa e nostalgia, causado pela ausência, desaparecimento, distância ou privação de pessoas, épocas, lugares ou coisas a que se esteve afetiva e ditosamente ligado e que se desejaria voltar a ter presentes; 2. cumprimentos a uma pessoa ausente; lembranças; 3. Botânica: nome de várias plantas da família das Dipsacáceas e das Compostas, e das flores respectivas. Caramba! Que coisa! Viu? De mágoa à nome de planta!

Já dá pra perceber que saudade é sentimento indizível. Pode ser tanta coisa e, ao mesmo tempo, nenhuma!

De acordo com a psicoterapeuta Olga Tessari, “a saudade é um sentimento que parte do ser humano, na necessidade de ter de volta algo que lhe fez bem, mas que de alguma forma, não pode estar mais presente no momento. Sentimos saudades de alguém pelo simples fato de buscarmos o conforto e a ótima sensação de uma determinada pessoa ou determinado momento vivido de maneira conjunta, assim, o nosso corpo acaba precisando ter de volta a sensação, causando aquele sentimento de vazio e boas lembranças”. Pode ser, mas, é uma explicação muito técnica…

Prefiro a poesia! Vejamos, por exemplo, os versos “Silenciosas lembranças” de Cecília Meireles (1901/1964): “De que são feitos os dias? De pequenos desejos, vagarosas saudades, silenciosas lembranças. Entre mágoas sombrias, momentâneos lampejos, vagas felicidades, inatuais esperanças. De loucuras, de crimes, de pecados, de glórias. Do medo que encadeia todas essas mudanças. Dentro deles vivemos. Dentro deles choramos em duros desenlaces e em sinistras alianças.”

E se você tem aí a sua saudade, remoendo-lhe a alma, cultive-a se você sentir que lhe faz bem, ou sufoque-a (não conseguirá “matá-la”) se você sentir que ela lhe causará dores ainda maiores. No mais… Permita-se, experimente, sinta e viva. Porém, não se esqueça que quem não sente saudade pode até ter sobrevivido, mas, não viveu!

Cláudio Zumaeta – Historiador graduado pela Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC, Ilhéus – BA)  Administrador de Empresas graduado pela Universidade Católica de Salvador (UCSAL, Salvador – BA). Especialista em História do Brasil (UESC, Ilhéus – BA). Mestrando em História Regional e Local (UNEB Campus V, Santo Antonio de Jesus. Membro da Academia Grapiúna de Letras (AGRAL).