Artigo de Mariana Benedito: Sobre criar raízes


*: “pausas para coisas que não signifiquem tanto aos parâmetros da produtividade, mas que significam demais aos nossos parâmetros de humanidade”


 

É fato que estamos vivendo uma era em que o resultado, a produção, a performance, o desempenho, o fazer, o agir, o render é supervalorizado. Vivemos em meio a uma correria insana sabe-se lá em direção a quê. Você já parou para se questionar isso, querido leitor? Por que e para que você está correndo tanto? Quando alguém nos pergunta como estamos e a nossa resposta é “estou aí na correria”, essa resposta é baseada em quê? Ela já se tornou automática para você?

A grande questão, meu amado leitor, é que essa correria, esse fazer o tempo inteiro, achar que está produzindo o tempo inteiro, estar em modo acelerado o tempo inteiro tem causado um mal perigoso e que requer a nossa atenção. A ansiedade tem se tornado, cada vez mais, companheira inseparável de uma geração.

Esse cenário é trágico porque a velocidade é angustiante. Se manter em movimento frenético o tempo inteiro é causa primordial de ansiedade, de angústia, de frustração. Nós precisamos de pausas. Pausas para nos ouvir, pausas para fazer coisas que não signifiquem tanto aos parâmetros da produtividade, mas que significam demais aos nossos parâmetros de humanidade.

E essa velocidade, essa rapidez, essa busca irrefletida pelo mais rápido possível nos distancia da criação de vínculos. Vínculos reais! As coisas demandam tempo para serem construídas, consolidadas, firmadas. Vínculos reais precisam de tempo. Nós somos seres que necessitam criar vínculos. Precisamos nos sentir pertencentes, amados, validados, vistos. E como vamos construir tudo isso se a gente nunca para? Se o fazer para ontem é o que importa? Que relógio para trás é esse?

Agora repare, pegue aqui na minha mão e acompanhe o raciocínio. Nós somos seres formados para criar raízes, vínculos, relações. É muito comum, a minha geração principalmente, com mais de 25 anos, achar super estranho uma pessoa que trabalha no mesmo lugar há 30 anos. Lembro perfeitamente bem quando fui fazer vestibular, aos 17 anos, e me peguei vendo minha mãe, com mais de 30 anos de serviço público, e pensei “Eu não quero ficar 30 anos fazendo a mesma coisa!”.

Reflexo de uma geração acelerada, não conseguia dimensionar que minha mãe é fera no que faz, com referência e credibilidade a nível nacional na área dela, justamente pelo tempo dedicado. São quase 40 anos de uma história profissional linear, com honrarias, com raízes que cresceram e se fortaleceram, justamente pelo cuidado e nutrição ao longo dos anos.

Somos seres que necessitam criar raízes, construir vínculos. Mas não está conseguindo porque, em algum momento, acreditamos que a velocidade é o mais importante. Estamos perdendo tempo. E repare bem, por não conseguir criar vínculos – porque a gente deseja relações incríveis em pouco tempo e com pouca dedicação –, usamos ainda mais a velocidade para camuflar a dor do vazio de não criar vínculos. E aí, meu amado ser que me lê aí do outro lado, é uma bola de neve regada a frustração e ansiedade.

Que a gente possa pausar esse relógio. Que a gente possa fazer valer o tempo. Cultivar as nossas amizades, fortalecer os nossos amores, criar conexão com nós mesmos. Criar intimidade com quem somos. Saber apreciar a solidão, a reflexão, o silêncio, a quietude.

Que a gente crie raízes. Que a gente saiba esperar o tempo para que o que delas brotar, possa florescer.

 

– Psicanalista; MBA Executivo em Negócios; Pós-Graduada em Administração Mercadológica;

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