Por Celina Santos
O advogado Edmilton Carneiro Almeida, especialista em Direito Trabalhista, acaba de completar um ano na presidência da OAB-Itabuna e tem a superlotação do presídio um dos principais problemas a combater. A entidade está empenhada na realização de audiências de custódia, apostando na medida como uma das alternativas para dar celeridade às demandas judiciais. Dr. Edmilton, que tem 25 anos de profissão, falou sobre este e outros assuntos em entrevista ao Diário Bahia.
Trazer as chamadas audiências de custódia para Itabuna é a principal bandeira da OAB hoje?
Olha, a principal bandeira da OAB é resolver a questão do presídio. Esse é um tema que nos preocupa há muito tempo; agora, veio aumentar essa preocupação por conta das rebeliões que têm estourado no Brasil todo. Mas a ministra Cármen Lúcia já editou uma determinação para que os tribunais de Justiça fizessem mutirões para resolver essas questões dos presídios. Porque, na verdade, a sociedade pensa assim: a pessoa praticou um crime, tem que ir para a cadeia. Está certo. Se transgrediu a lei, tem que ser punido. Mas acontece que os presídios estão superlotados de pessoas, na grande maioria, já condenadas, reincidentes. Então, não é justo aquele que praticou um crime pela primeira vez ser colocado junto com esses. O que tem acontecido sem audiência de custódia? O sujeito é preso, encaminhado para o presídio, é colocado no meio daqueles que já são condenados e sai de lá com uma responsabilidade, determinada pelo Raio A ou pelo Raio B.
Como as audiências vão interferir nesse “roteiro”?
A audiência de custódia vai fazer essa triagem. Não quer dizer que vai liberar o indivíduo que praticou o crime e o processo vai desaparecer. Não! O processo vai continuar e lá na frente ele pode receber uma condenação. Todo mundo está sujeito a que a desgraça bata na porta e transgrida a lei. Vai jogar essa pessoa lá dentro de um presídio cheio de pessoas que são psicopatas e já têm um histórico de criminalidade muito grande? Isso não é justo. Para a Justiça brasileira, ele não vai ter nunca a “pena de indignidade humana”; não existe essa pena. Então, o que a gente quer é que o preso seja tratado dignamente, porque o objetivo do Direito Penal é a ressocialização. Que o preso pague sua pena e volte para a sociedade.
O senhor considera que no presídio de Itabuna, de certa forma, os detentos estão cumprindo essa “pena de indignidade humana”?
No momento em que existe um presídio criado para 575 vagas e existem 1.400 detentos, existe a ‘pena de indignidade humana’. Num cubículo mínimo, sobrevivem vários detentos; isso é indignidade. A sociedade tem que se reunir… [O estudioso] Marquês de Beccaria [que humanizou as penas do Direito] tem um dizer interessante: ‘As penas não são justas quando a sociedade não emprega os meios para coibir o delito’. Se alguém não faz nada, o retorno é o que nós estamos vendo. É nessa linha que estamos pensando que devemos trabalhar. Em Itabuna, especificamente, o presídio abriga detentos de quase 35 municípios; os juízes daqui respondem por 18 comarcas. Se existe uma superlotação no presídio, existe também uma superlotação de processos para os juízes. Temos que chamar a atenção do Tribunal de Justiça para rever esse fato.
Sobre as audiências de custódia, falta o quê para elas acontecerem em Itabuna?
Para acontecer a audiência de custódia, é preciso ter uma logística: é preciso ter um juiz à disposição, um promotor público, um defensor público, o comando da Polícia Militar para transportar presos do presídio até o fórum e também delegados e policiais civis. Porque a audiência de custódia acontece até 24 horas do momento em que ele vá preso. Tivemos uma reunião com os juízes ontem [dia 24 de janeiro], faltou apenas uma conversa com o comando da Polícia Militar e Polícia Civil. Mas todos os juízes se predispuserem a fazer audiências de custódia a partir de fevereiro. Estão alinhando apenas alguns detalhes.
Existe uma estimativa de em quanto essa medida iria diminuir a superlotação no presídio?
O que vai se evitar é o seguinte: quando alguém é preso aqui, sem audiência de custódia, é encaminhado diretamente para o presídio. Pra ele ser solto, a audiência só vai acontecer 30 ou 40 dias depois. Isso superlota o presídio. Quando faz uma audiência de custódia, que o juiz já ouve a parte, vê que o crime é de pequena monta e pode responder em liberdade, ele faz logo. Se é um crime grave e foi feito o flagrante, ele tem que obrigatoriamente ser recolhido preso. Mas a estimativa que a gente faz é que deva diminuir de 30% a 40% [a superlotação].
Embora a direção não admita, todos sabem que os detentos são divididos no presídio de Itabuna de acordo com a facção a que pertencem. Até que ponto isso evita o risco de rebelião?
Isso é uma questão muito delicada. O crime se organizou de tal modo que se não for dessa forma, é capaz de realmente ter uma rebelião; porque eles comandam lá dentro. Então, é uma coisa que precisamos estudar pra ver o que se pode fazer. Mas acho muito difícil eles se misturarem. Hoje é Raio A, Raio B e DMP. Cabe ao Estado coibir e tomar providência nesse sentido. Acho que só tem um caminho, e não é a curto prazo: é a ressocialização e a socialização.