Bem-vindo à realidade


Mariana Benedito*: “A gente estabelece padrões, bota as coisas em caixinhas e perde o prumo”


                 

Oi? Você pode estar se perguntando que raio de título é esse desta coluna, meu caro leitor. Como assim bem-vindo à realidade? Realidade não é o momento presente? Justamente, meu caro Watson! E é exatamente aí que se encontra a chave dessa questão. Pois bem, calma! Pega sua xícara de café, de chá, seu copo de água e vem cá comigo para a gente ter um dedo de prosa.

Repare, a gente se firmar na realidade pode parecer algo óbvio, mas demanda um pouco mais de atenção do que supõe a nossa vã fantasia. Realidade significa o que está posto, o que é, o que há, o presente, a situação e circunstância que temos diante de nós. O fato é que a gente se perde no meio disso aí. Mas como a gente se perde?

Todo mundo idealiza situações, pessoas, relações. A gente estabelece padrões, bota as coisas em caixinhas e perde o prumo quando a vida acontece. Ou seja, quando as coisas não saem como a gente planejou, quando as pessoas não agem ou são da maneira como a gente deseja, quando as relações não seguem o rumo que a gente gostaria. E aí, meu amado ser de luz que habita aí do outro lado desta coluna, a gente deixa de viver o que existe – a realidade – e se fixa em olhar o que falta no outro ou na situação para preencher todos os quesitos da nossa idealização.

Vou exemplificar. Visualize a seguinte situação: uma moça solteira que deseja encontrar uma pessoa para compartilhar a vida e esfregar o pezinho nas noites frias. Beleza? Para ela, demonstrar afeto significa sair junto, andar de mãos dadas nos points da cidade e postar foto de casal no Instagram. Eis que ela encontra alguém com um papo legal, que a química rola e eles decidem engrenar um relacionamento. Tudo lindo! O par dessa moça da nossa historinha cuida dela, faz comidas que ela gosta, se mostra presente e querendo fazer parte da vida dela; gosta de sair e andar de mãos dadas pelos lugares badalados, mas é um tanto avesso às redes sociais e pouco posta coisas do casal. A moça começa a questionar o porquê o par dela não expõe os dois juntos e isso, ao longo do tempo, se torna um impasse. Ela começa a se distanciar de tudo que o par faz por ela e pela relação, passando a se fixar somente no fato de que ele não posta fotos nas redes sociais.

Ou seja, meu amado leitor, ela idealizou uma forma de relação, se fixou nesse padrão e acreditou que um relacionamento só estaria firmado se seguisse essa cartilha. Ela se distanciou do que existia ali disponível para ela, não estava mais recebendo tudo o que o outro tinha para ofertar para ela e para a relação, porque só olhava para o que faltava. Ela deixou de receber o real, o que estava posto, o que existia, porque idealizou um padrão. Consegue perceber, meu caro leitor? A gente deixa de receber o que há, porque fica fixado em receber tudo do jeito que a gente idealiza.

E isso vale para tantas coisas! Se algo não acontece exatamente do jeito que a gente quer, batemos o pé que nem criança birrenta e não queremos mais. Deixamos de olhar com olhos adultos o que está sendo ofertado, o aprendizado que está por trás de alguma situação, o amor que existe em uma relação, os valores que podemos construir em um momento de adversidade. E fantasiamos. Idealizamos situações perfeitas para seres que não são perfeitos.

Viver a realidade é olhar para o que já existe aqui. Não estamos falando de se contentar ou se diminuir para caber em espaços que não nos cabem. Não é isso! É sobre olhar para a vida com olhos de verdade, cessando a fantasia e entendendo que as dificuldades, adversidades são só a vida acontecendo.

Que a gente não se distancie do real por uma criação da nossa cabeça.

 

* Psicanalista em formação; MBA Executivo em Negócios; Pós-Graduada em Administração Mercadológica; Consultora de Projetos da AM3–Consultoria e Assessoria.

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