COLUNA DE MARIANA BENEDITO – As redes são mesmo sociais?


“A tristeza, a dúvida, a insegurança, a desmotivação são vistas, erroneamente, como fraquezas”


 

Já parou para pensar nisso, caro leitor?

Qual a função de algo social? Integrar, somar, inserir, sociabilizar. Até que ponto as redes sociais cumprem, de fato, este papel? Avalie e siga aqui comigo neste raciocínio: é notório – e, inclusive, objeto de estudos no meio do comportamento humano – o quanto que as redes sociais se transformaram em gatilhos de depressão e ansiedade.

É, isso mesmo. O Instagram, essa imensa e aberta vitrine da felicidade, bem-estar, realização pessoal e profissional, é, hoje, um dos principais motivadores de crises depressivas. E isso é assustador! Que o Instagram é uma rede de postagens programadas, isso todo mundo sabe. Dificilmente a gente encontra coisas reais postadas lá, como momentos de tristeza, desalento, cabelos desarrumados, caras lavadas de maquiagem, sem filtros. Uma grande parte dos perfis ainda é pautada no compartilhamento de melhores momentos e é justamente aí que entra a chave da comparação.

Agora você imagine que não está num dia legal – o que é normal, diga-se de passagem. Teve um dia estressante, brigou com alguém, está desmotivado, cansado, acordou naquele dia em que as coisas não fluem. E aí, para passar o tempo e tirar o foco de tudo isso que está te pesando, você vai para o aplicativo que está ali ao alcance rápido do dedinho e passa tanto tempo subindo aquele feed infinito. Uma postagem de uma viagem massa, outra postagem de uma mesa milimetricamente organizada, outra de alguém produzindo em alta no trabalho e por aí vai. É inevitável que o primeiro pensamento que grite em sua cabeça não seja o de inadequação; algo do tipo: “eita, eu estou aqui sem conseguir dar conta das coisas que tenho para fazer, enquanto o mundo inteiro vive de forma plena.” Veja, meu caro leitor, não é assim que a banda toca.

Vamos observar a coisa de um âmbito mais profundo. A gente vive em um meio que nos cobra ser bons o tempo todo. A tristeza, a dúvida, a insegurança, a desmotivação são vistas, erroneamente, como fraquezas. E aí a gente precisa sentir que está respondendo de forma positiva a essa cobrança social; e qual a melhor forma? Mostrando, postando, expondo, dizendo “olha como eu me encaixo, como eu dou conta, como eu sou feliz, como minha vida é pautada nos parâmetros exigidos!”, escolhendo a foto melhor enquadrada dentre as vinte e oito tiradas, com efeitos e filtros. Mas a vida não é espetáculo o tempo inteiro. E que bom que não é!

Mas entramos em outro aspecto muito importante: até que ponto a nossa autoestima, a nossa valorização está diretamente proporcional a quantas curtidas e comentários temos em nossas postagens? Até que ponto nos moldamos e esperamos o reconhecimento pelo quanto somos vistos e admirados nas redes sociais? Até que ponto o número de curtidas deixa de ser um número para ser seu parâmetro de autoestima? E por que só podem ser postadas as melhores fotos, com os melhores enquadramentos, melhores iluminações, melhores ângulos, melhores rostos e roupas? Cadê o ser humano, com todas as suas nuances, por trás de tudo isso?

Observe, caro leitor, que com isso tudo aqui, eu não estou dizendo para transformar sua vida em um livro aberto no mundo virtual ou que seja errado postar suas conquistas, suas viagens, seus momentos de bem-estar; muitíssimo pelo contrário! A ideia é a gente ter em mente que as redes são justamente para isso: trocar momentos, vivências, histórias; sem perder de vista que a vida é muito, mas muito mais que isso. A vida não cabe na tela de um celular, definitivamente. Toda a complexidade do ser humano, com seus altos e baixos, com a verdade nua e crua, só se vive no mundo real.

E deixo mais um ponto de reflexão, amadíssimo leitor: que a gente não se esqueça desse mundo real. Das conexões reais. Do olho no olho. Do abraço, do toque, do colo. Dos momentos sem celulares, dos momentos sem fotos e postagens. Dos momentos vividos sem a necessidade de mostrar que está vivendo. Que a gente possa focar no lado positivo da utilização das redes, seguindo perfis que sintonizem com a gente, que lembrem justamente dessa verdade humana.

Que a gente tenha tempo para estar presente. Vivendo.

 

* Psicanalista em formação; MBA Executivo em Negócios; Pós-Graduada em Administração Mercadológica; Consultora de Projetos da AM3–Consultoria e Assessoria.

E-mail: [email protected]