Coluna de Mariana Benedito – Medo


“a mente embarca no medo e na apreensão com o futuro, evitando, muitas vezes, que a gente enxergue o agora”


                

Com todo esse movimento e momento que estamos vivendo, meu caro leitor, uma das principais palavras que a gente tem ouvido é pânico. Uma reação descontrolada a algo que assusta ou amedronta. O medo acaba surgindo como consequência deste pânico, ativando um estado de ameaça, perigo e tensão constantes. E, como já é bem familiar para todos nós, frequentemente a gente deixa o medo controlar nossas vidas.

É fato que existe uma pandemia, é fato que existe o risco e a preocupação com o futuro de tudo, não é mesmo? Mas um ponto importante que a gente pode discutir aqui, nesta coluna, meu amado ser, é que o medo gera mais medo. As atitudes racionais que podemos – e devemos – ter neste momento são as de prevenção, sair de casa somente para o que for estritamente necessário e tomarmos alguns cuidados de limpeza e assepsia que, convenhamos, a grande maioria deste mundão não tinha.

A grande questão, queridíssimo leitor, é que quando nos deixamos ser levados pelo medo, começamos a nos comportar e nos preocupar com coisas que ainda não aconteceram. Aí você pode agora me dizer – como se estivéssemos numa conversa, tomando um chá, em breve poderemos fazer isso – que o cenário e as perspectivas são caóticos. Sim, são. Mas o centro da reflexão aqui é justamente a gente poder parar e ver que, de certa forma, a mente embarca no medo e na apreensão com o futuro, evitando, muitas vezes, que a gente enxergue o agora.

O medo nos protege, faz a gente parar e analisar se determinada situação coloca em risco a nossa sobrevivência, é o nosso filtro do que podemos ou não fazer para nos mantermos bem; mas, por outro lado, nos impossibilita de enxergar as possibilidades à nossa frente. Ficamos somente ruminando a mesma situação o tempo todo e perdemos a oportunidade de ver o que o momento requer. Mais uma vez, medo alimenta mais medo. E, numa tentativa natural do ser humano, embora inconsciente, a gente busca validar o tempo inteiro que é real aquilo que estamos sentindo e imaginando. Repare bem. Estamos com medo. Buscamos no “mundo externo” situações, comportamentos que validem a nossa sensação e digam: olhe como você tem razão em estar com medo! E daí passamos a alimentá-lo ainda mais, numa gigantesca bola de neve. Enviamos áudios e mais áudios pelo WhatsApp que reforcem o nosso medo. Passamos a enxergar as situações numa proporção descomunal, buscando por mais e mais casos, mais e mais mortes confirmadas, para justamente espalhar e alimentar mais o medo. Consegue perceber?

A gente acumula o medo. Junto com o álcool em gel, comida, remédio passamos a estocar medo também, em doses cavalares, e fazemos o maior esforço para provar, para nós mesmos, que o mundo de fato não é um lugar seguro. Passamos a colocar a nossa cabeça e nossos pensamentos lá na frente, ansiosos por não saber como ficarão e serão as coisas no futuro.

E eu te pergunto, meu caro leitor, quando foi que a gente soube? A gente acha que tem controle sobre as coisas, mas lamento, temos não. A gente sabe que um dia todos morreremos, cedo ou tarde, mas vivemos a vida como se fôssemos imortais e como se tivéssemos todo o tempo do mundo para fazer tudo. Não temos. O medo nos cega para o fato de que, realmente, não sabemos o dia de amanhã. Nunca soubemos. Quantas vezes a gente adiou fazer algo que nos faz bem, encontrar alguém que há muito não víamos, dizer que amamos e estar próximo das pessoas? Sempre inventamos milhares de compromissos e afazeres. Estamos agora tendo a oportunidade de perceber que protelar, adiar, colocar para depois as coisas simples, os abraços, os encontros, o estar presente não é o melhor caminho. Só o não poder para nos dar esta dimensão.

Já que este é o momento mais importante para que a gente não coloque tanto a cabeça lá na frente e alimente ainda mais o medo, que a gente possa aproveitar o agora para retomar os laços internos e valorizarmos o que realmente importa, logicamente que seguindo todas as orientações técnicas dos profissionais de saúde.

Que a gente faça a nossa parte.  

 

* Psicanalista em formação; MBA Executivo em Negócios; Pós-Graduada em Administração Mercadológica; Consultora de Projetos da AM3–Consultoria e Assessoria.

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