Conselheiro tutelar alerta: Não precisa esperar 24 horas para comunicar desaparecimentos



O Conselheiro Tutelar, Robenilson Sena, diz que quanto mais rápido a polícia agir, mas chance terá de salvar a vítima
O Conselheiro Tutelar, Robenilson Sena, diz que quanto mais rápido a polícia agir, mas chance terá de salvar a vítima

 

Por Simone Nascimento

 

Em 2013, a pequena Andressa dos Santos, de apenas seis anos, desapareceu da casa dos pais, em Almadina. Foi quase um mês de aflição, de buscas e investigações, até que o caso tivesse um final trágico. O corpo da criança foi encontrado boiando nas águas do Rio Almada. E nos bastidores desse sumiço, a descoberta de que Andressa havia sido sequestrada, estuprada e enforcada pelo próprio primo, que cumpre pena no Presídio de Itabuna.

Relembramos essa história só para entrar numa questão séria e que, infelizmente, não é sabida por muita gente. O tempo de comunicação sobre o desaparecimento de uma pessoa pode ser determinante nas buscas, prisão de supostos responsáveis e, sobretudo, uma “corrida contra o tempo”, para evitar estupros, torturas e mortes. Em entrevista ao Diário Bahia, o conselheiro tutelar Robenilson Sena Torres esclareceu que não é preciso mais os familiares da vítima aguardar entre 24 e 48 horas após o desaparecimento, para registrar um boletim de ocorrência na Polícia Civil.

Para ele, esse tipo de burocracia não passa de um mito. “Não há respaldo legal para tal informação. Caiu no senso comum e é reproduzido. Não raramente, famílias são até orientadas em algumas delegacias a aguardarem antes de registrar o desaparecimento. Tal ideia, além de equivocada, reduz as chances de localização”, alertou.

Segundo Robenilson, quando se trata, principalmente, de crianças e adolescentes, num prazo de 24 horas é possível evitar que esses menores saiam do estado, do país e que sejam vítimas de violência sexual seguida de morte, como aconteceu com a pequena Andressa. “A legislação é bem clara quando diz que a delegacia é obrigada a começar as buscas e também a acionar a Polícia Federal, Rodoviária, aeroportos. Infelizmente, em muitos municípios a lei não é cumprida”, observou o conselheiro.

Ele lembrou, inclusive, o que diz o artigo 208, do Estatuto da Criança e do Adolescente, alterado pela Lei nº 11.259, de 30 de dezembro de 2005. Com a mudança, a investigação policial tem que ser imediata em casos de desaparecimento de crianças e adolescentes. “A Lei é conhecida como Lei da Busca Imediata”, acrescentou Sena.

De acordo com o conselheiro tutelar, se o delegado não aplicar a Lei de Busca Imediata, recusando-se a fazer a ocorrência e as buscas, ele estará cometendo crime de prevaricação. “A família deve comunicar ao Conselho Tutelar e ao Ministério Público ou até mesmo ao Disque Direitos Humanos – 100. É preciso que a sociedade tenha conhecimento dessa lei”, insistiu Robenilson.

 

“Encurralados pelo tráfico”

Dados do Ministério da Justiça apontam que, a cada ano, pelo menos, 250 mil pessoas somem sem deixar vestígios no Brasil. Desse número, estima-se que, aproximadamente 40 mil sejam menores de idade. Em Itabuna, as estatísticas de crianças e adolescentes desaparecidos não são nada boas. Em 2016, o Conselho Tutelar local atendeu a uma média de 10 situações envolvendo notícias de desaparecimentos e orientou as famílias a registrarem boletim de ocorrência. Mas, os números podem ser maiores.

“Vale ressaltar que ainda contamos com um problema a ser corrigido, que é a falta de integração entre os órgãos, o que faz com que os números reais de pessoas desaparecidas fiquem imprecisos, fazendo com que famílias deixem de ser acompanhadas e o cadastro nacional permaneça desatualizado”, ressalvou Robenilson.

Quanto ao perfil dos desaparecidos, esse dado mostra uma realidade enfrentada por centenas de menores, reféns do tráfico. A maioria dos desaparecidos é formada por adolescentes, que fogem de casa, muitas vezes “encurralados” pelas dívidas contraídas junto a traficantes. Outros tantos preferem fugir por causa de ameaças de morte. Os conflitos familiares surgem em segundo plano. No entanto, não são menos preocupantes que a primeira situação. E em terceiro lugar vêm os casos de menores que fogem para viver com o namorado.

“Orientamos aos pais que fiquem atentos às mudanças no comportamento de seus filhos, às amizades, com quem estão conversando na internet. Observar se estão usando drogas, se estão mais agressivos. São cuidados que não devem ser negligenciados. Encontramos frequentemente crianças menores de seis anos andando pelas ruas desacompanhadas de responsáveis, prática comum, principalmente nos bairros periféricos de Itabuna. Vulneráveis, portanto, ao fenômeno do desaparecimento por rapto, como já há inúmeros registros”, argumentou.

 

Sem acompanhamento

Em seus anos de experiência como conselheiro tutelar, Robenilson destacou que a falta de acompanhamento da família no dia-a-dia dos filhos adolescentes é uma realidade que precisa ser mudada. “Isso tem permitido o surgimento de muitos casos de desaparecimentos pelos motivos já expostos. E a falta de celeridade no registro e nas buscas tem prejudicado. A gente trabalha contra o tempo. Se a pessoa quebrou a rotina, sem motivo aparente, registre o boletim de ocorrência o mais rápido possível. O papel da sociedade é importantíssimo. Através da imagem divulgada, na imprensa e nas redes sociais, a população pode ajudar na busca”, recomendou o profissional.

Lembrando que os familiares podem entrar em contato com o Disk 100. Por meio desse telefone, é possível informar o sumiço de uma criança ou adolescente. As informações serão encaminhadas para os órgãos competentes e as devidas providências serão tomadas. “A ligação é gratuita. O serviço está disponível sete dias por semana, durante 24 horas”, acrescentou Robenilson Sena.

Casos de desaparecimentos, como o da pequena Andressa, de apenas seis anos, terminou em tragédia
Casos de desaparecimentos, como o da pequena Andressa, de apenas seis anos, terminou em tragédia