E esse ar de superioridade, hein?


Mariana Benedito*: “A gente ocupa a cabeça falando do outro para não sobrar espaço de falar da gente"


 

Eu não sei você, meu amado leitor, mas eu sou fã de reality show. É isso mesmo. A gente consegue perceber claramente os comportamentos sociais e o que o ser humano é capaz de realizar quando colocado diante de situações de privação. Pois bem, está acontecendo mais uma edição do Big Brother Brasil, e dessa vez eu nem estou acompanhando, mas fica muito difícil não falar sobre isso quando as redes sociais estão abarrotadas de comentários sobre alguns participantes.

Fato é que um comportamento específico me chamou a atenção e eu gostaria de compartilhar com você, amado ser que me lê aí do outro lado: o quanto a gente ainda está no padrão de julgamento. O quanto a gente ainda está no processo de recolher o dedinho que aponta o erro do outro.

Você já parou para pensar como é muito cômodo simplesmente sair destilando críticas, insatisfações, reprimendas, condenações por este mundão? O tempo que se gasta apontando o dedo para os defeitos do outro evita que a gente se coloque à prova. A atenção que a gente coloca em perceber o comportamento do outro desvia a atenção que a gente deveria colocar em observar os nossos próprios comportamentos. A gente ocupa a cabeça falando do outro para não sobrar espaço de falar da gente. Para nós mesmos.

E é justamente aí que mora o xis da questão, meu caro leitor. Quando a gente aponta a falha do outro, um defeito que a gente acha que é algo negativo, na maioria esmagadora das vezes, nós estamos enxergando nele a falha e o defeito que existe em nós e não temos ainda a capacidade emocional de perceber – e aceitar.

Vou dar um exemplo pessoal. Eu passei boa parte de minha adolescência dizendo que meu pai conversava e falava demais. Sem perceber, escondia de mim mesma o desejo que eu tinha de também me expressar livremente; passei algum tempo omitindo para mim mesma o meu lado comunicativo, expansivo, extrovertido. Fui amadurecendo e vendo que isso também me pertencia, que a comunicação também me habitava. Mas eu apontava o dedo desaprovando e julgando e criticando. Quando eu comecei a entender que essa faceta também habita em mim, além de desenvolver habilidade de expressão – e de falar pelos cotovelos e estar aqui escrevendo esta coluna há mais de dois anos – também o julgamento com relação ao meu pai foi diminuindo.

Você consegue perceber, meu amadíssimo leitor? Quando a gente aponta o “defeito”, além de não enxergar em nós que aquele aspecto também nos pertence, nos colocamos em um patamar de superioridade. Eu sou uma semideusa que, aqui de cima, sentada no meu trono de plumas no Olimpo, posso julgar se as atitudes e comportamentos e ações do outro estão corretas ou não. E, ainda podendo ficar pior, posso condená-lo ao sofrimento por meio das minhas críticas constantes, rompantes de raiva e menosprezo.

Loucura, não é mesmo? Mas a gente faz. E faz bastante.

Esse ar de superioridade que, muitas vezes, a gente respira, na verdade esconde uma grande insegurança e medo de olhar para os nossos próprios buracos.

 

Psicanalista em formação; MBA Executivo em Negócios; Pós-Graduada em Administração Mercadológica; Consultora de Projetos da AM3–Consultoria e Assessoria.

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