O domingo



 

Solidão é você despir-se de todas as relações sociais e ver a si mesmo in natura, sem a mediação de qualquer outra pessoa. O professor Dário Mendonça passava a semana toda correndo de uma escola a outra, dando aulas de matemática. Repetia aos colegas e a si mesmo em vários momentos: “Tou cansado! Tou doido que cheguem o sábado e o domingo!” E chegou mais do que ele esperava: a sexta foi feriado e ele tinha um longo fim de semana. Ao chegar em casa, na quinta de noite, a mulher e os dois filhos estavam de saída para uma excursão da igreja. Mal teve algumas informações sobre a comida: “Tem arroz e feijão na geladeira! Os bifes estão no congelador, é só fritar!” Quando saíram, prof. Dário levantou os braços para cima e pensou aliviado: “Graças a Deus! Três dias de paz e sossego!” Esticou-se no sofá, ligou a televisão e ficou gozando o prazer de não ter de levantar cedo no dia seguinte para dar aulas. De noite, esquentou a comida, abriu uma cerveja e comeu com o prato na mão, assistindo ao noticiário na TV. Adormeceu no sofá e acordou umas 2h da madrugada. Lembrou que estava sozinho em casa. Quis voltar ao sono, mas, sendo o dia seguinte feriado, ficou sem qualquer motivo para dormir. Pensou em ir preparar aulas, mas não haveria escola nos próximos três dias. Ligou a televisão mas não conseguia acompanhar o filme que passava. E, de repente, sentiu-se perdido, barco sem rumo, sem sono, espichado naquele sofá, em plena madrugada silenciosa, sem alunos que o chamassem de professor, sem a mulher que o chamasse pelo nome, sem os filhos que o chamassem de pai. Sua identidade vinha dessas pessoas. Sem elas, era agora  um espantalho vazio, sem alma…