Você já parou para pensar nisso, meu amado leitor? Nós somos seres pautados, essencialmente, na capacidade de sentir e a gente passa uma vida fugindo disso. Fugindo da nossa essência, do nosso poder, da nossa verdade. E, lá na frente, nos deparamos com a ansiedade, com a angústia, com o medo, com o vazio justamente de uma vida sem sentido. Repara que paradoxo!
Estive pensando sobre isso nos últimos dias, ao perceber esse padrão na prática clínica e até mesmo revisitando o meu próprio processo de amadurecimento emocional. O quanto fugimos de sentir! A gente corre desenfreadamente para todos os lados com o objetivo simples de não sentir o que estamos sentindo. Nos refugiamos na cabeça, na racionalidade cega, no entendimento dos porquês, só para não abrirmos espaço para que as emoções venham e passem pela gente. Nos mantemos ocupados 25 horas por dia! Procuramos distrações, fugas para não acessar o que está gritando freneticamente dentro da gente. Por quê?
Existe a falsa, errônea e equivocada ideia de que a gente não pode sentir medo, raiva, tristeza, aquela sensação de que estamos perdidos no tempo e no espaço e todos esses sentimentos e emoções que a gente categoriza como negativos e, para não sentir, no momento em que essas emoções estão vindo à tona, a nossa ação é de imediatamente dispensá-las, rechaçá-las, dizer para nós mesmos que devemos nos livrar dessas emoções a todo custo. Só que, meu amado ser de luz que lê estas linhas aí do outro lado, a grande questão não é que a gente não possa ou não deva sentir, mas sim os meios que a gente utiliza para não sentir. Ficou confuso? Calma. Respire fundo.
O principal objetivo das pessoas que iniciam uma caminhada pelo autoconhecimento é justamente identificar, entender e compreender os momentos e gatilhos que desencadeiam essas emoções que a gente citou logo aí em cima. Mas chegamos aqui num impasse de entendimento. Muito se observa o quanto a maioria das pessoas busca não sentir determinada emoção percorrendo o caminho de se livrar dela, e é o caminho justamente oposto! Vamos botar aqui a situação em que você, meu amado leitor, se aborrece e fica com raiva porque uma pessoa não agiu como você esperava que ela agisse. Ok? Imaginou? Beleza. Aí você se depara com o bichinho da raiva mordendo seu pé. Qual a primeira reação de uma pessoa que está no processo de fuga do que sente? Não posso sentir raiva, preciso mandar ela embora. Só que, meu bem, o caminho para se percorrer qualquer emoção, sensação é passando por ela. Pois é.
Então, no momento em que sentir a raiva chegando, pare e respire. Tente entender que mensagem ela traz, o que ela está querendo te dizer. A raiva, o medo, a tristeza são guardiões de dores; eles guardam a sete chaves aspectos e lacunas nossas. Pegando o mesmo exemplo de ter sentido raiva por uma pessoa que não agiu como se esperava que ela agisse, o caminho é se questionar o porquê de querer controlar o comportamento do outro, que pedacinho seu se sente contrariado quando não é satisfeito?
Mas, veja, obviamente que isso não quer dizer que você tenha que soltar os cachorros em cima de quem quer que seja alegando que está se permitindo sentir. Nada disso. Calma lá! Até porque aí já seria liberar uma energia destemperada e que já caberia outro questionamento: por que a necessidade de agredir o outro?
A gente pode observar que não existe “o outro”, todos são reflexos de nós mesmos e grandes mestres que nos apontam onde ainda precisamos melhorar. Mas isso é para quem está disposto, porque não é fácil trazer para si a responsabilidade dos atos, ações e reações. É muito mais fácil culpar o mundo pela forma como a gente age.
Encarar esse lado sombrio de nós mesmos chega a dar um verdadeiro frio na espinha. E a gente foge. Tem medo.
São tempos de transformação, não há mais como fugir das mudanças necessárias a cada um de nós.
É o único caminho. Não tem para onde correr.
Continuar fugindo é continuar mentindo para nós mesmos.
* Psicanalista, terapeuta e especialista em Marketing
Instagram: @maribenedito