Você está preso!


Mariana Benedito: “A gente acha que está se aproximando e se conectando com quem está longe e, na verdade, está se distanciando de quem está perto”


Convenhamos que ninguém deseja ouvir isso na vida, não é, meu amado leitor? Eu não sei você, mas eu acredito que um dos maiores bens que a gente pode ter é a nossa liberdade. Todo e qualquer tipo de prisão, aprisionamento, cerceamento, tolhimento causa um grande impacto psíquico, físico, mental, emocional. Mas uma coisa cada vez mais comum e rotineira nos nossos dias – e que não estamos devidamente atentos – é a prisão invisível das telas, redes sociais, linhas do tempo e conversas por aplicativos de mensagem.

Há uma gigantesca possibilidade de que você esteja lendo estas linhas aí do outro lado por uma telinha; e de forma alguma é minha intenção problematizar e condenar o uso do celular, da tecnologia, da internet. Muitíssimo pelo contrário! Meu trabalho atualmente é quase todo pautado na tecnologia que aproxima quem está distante, 95% dos meus atendimentos são online e eu sou uma grande entusiasta e muito grata por essa possibilidade. O beré incha quando a gente começa a ficar mental e emocionalmente dependente do celular.

Eu vou te fazer uma pergunta, meu amado leitor, e seja sincero com você mesmo, ok? Aqui é você com sua consciência – e quanto mais honesto, mais chance de reconhecer um escorregão na casca de banana e mudar de rota. Então lá vai: quantas vezes você pega seu celular só para ficar conferindo os grupos de WhatsApp ou subindo eternamente o feed do Instagram e Facebook? Quantas vezes você foi fazer alguma coisa, de fato, no celular e daí chegou uma mensagem, você foi olhar outra coisa no Instagram que puxou para outra coisa e depois para mais uma e, quando você se deu conta, passaram-se trinta minutos? Quanto tempo você fica longe do seu celular? Quantas vezes você já se pegou – se é que já se pegou – com a vida acontecendo ao seu redor e você com a cara enfiada no celular? Pessoas ao seu redor conversando, interagindo, contando histórias, trocando vivências e você rolando o feed do Instagram, vivendo a realidade paralela do metaverso.

É, no mínimo, curioso o fato de estarmos vivendo uma era de tudo à palma da mão, de quando quer assistir a um filme é só abrir a Netflix e ter zilhões de possibilidades, do imediatismo, de não saber esperar o tempo das coisas, dos áudios acelerados, da impaciência, da fuga e depois abrir a boca para reclamar que a vida está passando rápido demais.

É lógico que está! Como é que você tem aproveitado o seu tempo? Está no real ou no virtual? Você está preso nessa tela e não consegue se dar conta da gravidade disso. A gente acha que está se aproximando e se conectando com quem está longe e, na verdade, está se distanciando de quem está perto. Quantas vezes você esteve em locais com amigos, familiares e nem sequer recorda o que aconteceu, o que foi conversado, compartilhado simplesmente porque não estava lá. O corpo estava. A cabeça, olhos e atenção estavam no celular. Deixou de aproveitar momentos reais para dar mais importância aos momentos virtuais; a gente reclama da falta de tempo e da correria não sei para onde para juntar um grupo de amigos e, quando consegue juntar, é cada um no seu mundinho virtual trocando mensagens em outros grupos de WhatsApp reclamando que não consegue se encontrar. Gente! Pelo amor de Deus!

O quanto esse aprisionamento prejudica a nossa vida ordinária, nas pequenas coisas do nosso dia a dia. Eu mesmo não tenho nem dedo que dê para contar as vezes em que deixei de realizar uma atividade sem a distração de responder uma mensagem no WhatsApp que poderia perfeitamente ser respondida depois, sem nenhum dano à humanidade. Mas não, ouve o barulhinho da notificação, o sinalzinho ali na barra de navegação do celular e partiu comer ansiedade com farofa de banana da terra. Já sentou do lado a angústia, o comichão, o bloqueio criativo que não consegue fazer mais nada enquanto não verificar a bendita da notificação.

É uma cobrança insana por responder as mensagens na hora exata que chegam – mesmo que você não possa responder naquele momento ou não seja o caso de tirar o pai da forca – por uma necessidade de estar conectado o tempo todo, por saber de todas as conversas dos quinhentos grupos; porque, caso contrário, nosso inconsciente grita de que não estamos mais pertencentes e, consequentemente, vamos perder afeto.

O buraco é bem mais embaixo.

Mas, para começo de conversa, já vale o questionamento: quem comanda quem? Você está realmente livre?

 

* Psicanalista e Psicoterapeuta

Instagram: @maribenedito