Ontem eu estava ouvindo a música “Ícaro”, da Banda Café, e ela me remeteu muito aos padrões de comportamento que a gente vai alimentando, reforçando, tornando hábito e, consequentemente, mais cedo ou mais tarde, parte de nós. Começamos a não conseguir nos ver sem aquele comportamento, sem aquele posicionamento, sem aquela visão de mundo – muitas vezes tão condicionada, tão programada. E vamos vivendo nessa engrenagem, como diz a música, acreditando que a vida se baseia somente em nascer, crescer, estudar, trabalhar, ganhar dinheiro, comprar e ter coisas, trabalhar mais, para ter mais dinheiro para ter mais coisas, envelhecer, para poder aproveitar o tempo perdido enquanto trabalhava e acumulava.
Os padrões que repetimos têm, na grande maioria das vezes, fundamentos inconscientes, de fato. De uma maneira bem direta, nós somos condicionados, programados; a visão que temos da vida e do mundo é consequência daquilo que vivemos, experimentamos, aprendemos, erramos. A minha história, visão, entendimento, percepção de tudo ao meu redor jamais será igual à sua, que me lê aí do outro lado neste momento. Todos nós temos uma espécie de caixinha dentro da mente que vai arquivando tudo que ouvimos durante a nossa infância, tudo que vivemos. Os nossos medos, fragilidades, forma de encarar uma situação adversa… tudo é resultado do que vamos colocando nesta caixinha.
Mas para que a gente possa ganhar percepção desses padrões inconscientes, podemos começar a perceber padrões que caracterizam a nossa rotina mesmo. Pegamos o mesmo caminho todas as vezes que vamos ao trabalho. Conversamos com as mesmas pessoas. Usamos a mesma xícara para tomar café – ou chá. Dormimos na mesma posição todas as noites. Fazemos as mesmas coisas todos os dias. Hábitos. Padrões. E estão tão enraizados, que a gente nem se dá conta mais do quanto repete. São exemplos extremamente simples, mas que nos despertam a perceber o quanto vivemos de forma previsível – durante uma vida inteira, até.
Pode ser que você, aí do outro lado, se atraia emocionalmente por pessoas com um perfil mais fechado, mais introspectivas e, depois, fica se perguntando por que sente tanta falta de demonstrações mais efusivas de carinho e afeto. Em relações amorosas, pode ser que você se atraia por pessoas com um perfil mais dependente, e depois vai reclamar que o outro não faz nada sozinho ou deixa as coisas todas nas suas costas. Essas são, realmente, escolhas inconscientes. Mas temos a oportunidade de nos tornar conscientes desses padrões. Como? Observando o que se repete. Com mais presença, com mais coragem, com mais leveza, com mais liberdade, passamos a escolher de forma diferente. Tirando o piloto automático e assumindo a direção.
Podemos observar com uma facilidade tamanha o quanto que estamos vivendo de forma robotizada. Vivemos o mesmo dia todos os dias! Essa repetição pode até nos passar uma ideia de segurança, de caminho conhecido, de estabilidade; mas será que estamos vivendo de verdade? Essa opção pela estabilidade nos sufoca! Esses condicionamentos e padrões se tornam uma espécie de teia e que, aos poucos, vai nos apertando, estrangulando, engessando. Vamos nos distanciando de nós mesmos, cada vez mais.
E para que possa começar a se dar conta dos seus próprios padrões, te faço um convite, amado leitor. Mude alguma coisa em sua rotina e observe como essa mudança pode afetar o seu dia. E que seja na mínima coisa. Pegue um caminho diferente para ir ao trabalho. Ao invés de almoçar com a cara enfiada no celular, dê uma pausa. Rompa esse hábito. Observe se isso te ajuda a sair um pouco dessa estimulação intensa que vivemos, dessa cobrança por ser mais o tempo todo, por ter mais o tempo todo.
A partir dessas pequenas mudanças, vá expandindo a sua percepção e observação para os padrões e repetições mais arraigados. Afinal de contas, é caminhando que o caminho se abre e é a partir de um pequeno passo que caminhamos grandes distâncias.
* Psicanalista em formação; MBA Executivo em Negócios; Pós-Graduada em Administração Mercadológica; Consultora de Projetos da AM3–Consultoria e Assessoria.