Artigo de Mariana Benedito – A força do olhar


“que coisa misteriosa é essa quando os olhares se encontram tanto e não conseguem se largar?”


 

Tem uma frase do livro Pequeno Príncipe, do escritor francês Antoine de Saint-Exupéry – um clássico da literatura! – que diz assim que “o essencial é invisível aos olhos”. E é mesmo, meu amado leitor! Mas você já parou para refletir sobre o quanto de força os olhos carregam? O quão invisível e poderoso e potente é a intimidade que um olhar carrega?

Me acompanhe aqui numa viagem, pegue sua xicrinha aí! Eu vou te convidar a fazer um exercício, tá bom? Pense e traga à sua lembrança os encontros que você teve ao longo da vida; quais são os que você lembra? Encontros com amigos, familiares, amores, pessoas relevantes que você teve uma conversa que tenha te marcado de alguma maneira. Como esses encontros aconteceram? Como você se sentiu? Estava ansioso, eufórico, tenso, amistoso antes desses encontros? Deixa que sua memória reviva esses momentos… agora eu te peço: lembre o olhar que se cruzou.

Repare como existem pessoas e situações que fogem do nosso olhar. Muitas vezes a conversa até flui, se desenrola bacana, existe um quê de familiaridade ali, mas o olhar não se sustenta; ao passo que existem olhares que são profundamente marcantes! Já parou para pensar na transformação que os olhares causam na gente? Que coisa misteriosa, estranha, inquietante é essa quando os olhares nunca se encontram? E que coisa misteriosa, estranha, inquietante é essa quando os olhares se encontram tanto e não conseguem se largar?

Existe uma coisa chamada intimidade, que é aquilo que a gente tem de mais próprio, mais verdadeiro, mais nosso mesmo. Quando a gente pensa em uma pessoa, qual a parte dela que vem à nossa memória? O rosto, não é? A gente pode não reconhecer o dedo mindinho do pé esquerdo de alguém que a gente conhece, mas dificilmente a gente não reconhece seu rosto e, mais especificamente, seu olhar.

Eu fico vendo minha filha, Maria Flor. Conheço sua mãozinha, seu pezinho de pão, o redemoinho que ela tem nos cabelos… mas quando ela adormece em meus braços, os meus olhos fitam seu rosto. O semblante sereno, a bochechinha que fica amassada no meu ombro. E, quando fecho os meus olhos e penso nela, me vem, nitidamente, seu rosto com olhos curiosos e um sorriso largo de dois dentes. É o rosto que nos traz intimidade.

Agora pense aqui comigo, meu amado ser que lê estas linhas aí do outro lado, retomando os encontros que vieram à tua lembrança no exercício lá de cima, me diga se é possível estabelecer intimidade genuína com alguém sem olhar-lhe nos olhos. O olhar é o primeiro contato, o primeiro vínculo, a primeira porta para se adentrar um universo. Perceba como fica difícil estabelecer uma relação mais profunda com alguém que não sustenta o olhar; ao passo que uma simples interação cotidiana tem um outro grau de qualidade quando os olhares verdadeiramente se fitam.

O que o seu olhar esconde, meu amado ser? O que ele revela? O quanto você está com seu olhar atento e aberto às pessoas que te cercam? O quanto de brilho seu olhar possui?

O olhar humano possui um tipo de véu que ora esconde, ora revela a nossa intimidade e a das pessoas que a gente convive. A nossa busca é calibrar essa balança, saber dosar o ponto de revelar e proteger, abrir e fechar o véu, criar-se ou não intimidade.

Tagarelar desenfreadamente não significa intimidade ou presença, nesse caso está se buscando apenas um ouvinte para um monólogo chato e sem substância; mas quando a gente dialoga, presente e verdadeiramente, com o olhar desperto, atento, entregue e vivo, essa é a máxima expressão do amor!

Qual o grau de humanidade e pertencimento que seu olhar carrega?

 

* Psicanalista, terapeuta e especialista em Marketing

Instagram: @maribenedito