Eu não sei você, meu amado leitor, mas uma percepção que tenho é de que a ansiedade, angústia, sensação de vazio e de incompletude nunca foram tão presentes em nossas vidas e ao nosso redor como agora. Eu acredito que todo o contexto da pandemia que passamos – e ainda vivenciamos seus resquícios – veio abrir nossos olhos e nos fazer enxergar, sem lentes de ilusão e fuga, esses nossos vazios e as dispersões interiores que a gente tanto vinha usando sem nem ao menos nos darmos conta.
Vou confessar uma coisa para você, querido ser que me lê aí do outro lado: eu já vivi muito nesta sensação de que algo me faltava. Mesmo nos momentos em que estive mais realizada pessoal ou profissionalmente, essa sensação estava aqui coladinha comigo e, volta e meia, dava uma bicuda em minha canela ou uma voadora em minha rinhada para que sentisse bem sua presença.
Uma vida que merecia ser vivida a plenos pulmões, nunca me faltara nada e as demandas estavam alinhadas, encaminhadas, mas, ainda assim, alguma coisa não estava no lugar. Nada preenchia aquele espaço. E eu não sabia o que era essa coisa, esse algo, nem muito menos como poderia preenchê-lo. E parecia que era aí que o negócio apertava mais: sentia, mas não sabia o que era, não conseguia nominar, não via motivo lógico para sentir esse vazio interno tão inquietante.
Peraí, deixa eu tomar um gole aqui do meu chá de capim santo. Pronto, agora me acompanhe aqui no raciocínio, meu amado leitor. Fique comigo aqui. Ao longo da minha jornada – e de algumas experiências terapêuticas, de autoconhecimento, de amadurecimento emocional – eu pude perceber que estava altamente centrada em construir, conquistar, armazenar coisas que acabam. É, isso mesmo. Vivia buscando alcançar somente sucesso na carreira profissional, conforto, estabilidade financeira, um relacionamento amoroso raso que suprisse minhas carências, um lugar para chamar de meu, um corpo bronzeado no verão e cachos devidamente hidratados.
Você pode estar agora aí querendo me questionar: “mas Mari, estas não são coisas importantes e que a gente precisa buscar para viver neste mundão de meu Deus?”. E eu te respondo: sim, são importantes. A questão aqui não é desmerecer ou desvalorizar ou pregar para todo mundo virar hippie e vender miçanga em Itacaré. Não, muito pelo contrário. O xis da questão é quando somente essas coisas passam a importar, quando a gente só foca nelas. Sabe por quê? Porque elas acabam. E a gente esquece que, no final das contas, a gente não leva daqui nada disso quando levanta o braço e Jesus puxa. Vulgo, quando a gente morre.
Pode parecer um discurso bem clichê e piegas, mas não é, meu amado ser de luz. A gente viver os nossos dias buscando somente acumular coisas que acabam, inevitavelmente, vai nos causar mais angústia e ansiedade, consegue perceber? E o pior é que a gente sabe que elas acabam e que está mesmo é desperdiçando vida tentando preencher um copo que está furado no fundo.
O que tapa este furo é dar uma nova forma a este copo. É preencher a vida com coisas que não acabam. Quando o trabalho que a gente desempenha na vida se torna somente uma fonte de dinheiro, é claro que, em algum momento, estaremos estafados! Mas quando a gente aproveita o trabalho para desenvolver valores como a paciência, a honradez, a retidão, a moral, o servir, a empatia com o colega, tudo ganha uma nova perspectiva e, consequentemente, nos dedicamos mais, rendemos mais e, olha só, lucramos mais. E isso vale para tudo na vida.
Se ater ao que é essencial, desenvolver valores onde quer que a gente esteja, buscar sentido nos compromissos mais triviais da nossa rotina é nutrir na vida as coisas que não acabam.
E são essas que nos dignificam e nos preenchem, de fato.
– Psicanalista, Especialista em Marketing
Instagram: @maribenedito