Por Simone Nascimento
De um lado, empresários que falam em nome do turismo pujante da histórica cidade de Porto Seguro e apelam em defesa da preservação dos empregos diretos e indiretos. De outro, o Ministério Público Federal, que defende a preservação ambiental e o cumprimento das esferas legais, previstas na Constituição. Um “embate” que vem gerando polêmica e ganhou os “holofotes” de todo o país.
Estamos falando da decisão da Justiça Federal de Eunápolis em demolir todas as barracas dos dois maiores complexos de lazer de Porto. Palco de um dos mais badalados réveillons do sul da Bahia, o Axé Moi, na paradisíaca praia de Taperapuã, pode estar com seus dias contados, assim como o famoso circuito Tôa–Tôa. Juntos, os dois complexos atraem mais de um milhão de turistas por ano. E no verão, esse número explode para oito mil, por dia.
As sentenças foram decretadas pelo juiz Alex Shamm de Rocha, no último dia 09 de setembro, após acatar as denúncias do Ministério Público Federal (MPF), que vem lutando com essas ações desde 2006. A decisão da Justiça prevê, ainda, uma pena de multa diária de 10 mil reais, caso a determinação não seja cumprida num prazo de 30 dias.
Segundo o MPF, as barracas ocupam a área de patrimônio da União, de domínio público e de preservação permanente, além de ser caracterizada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) como Zona de Valor Paisagístico. Outro agravante, de acordo com o Ministério Público, é que as barracas teriam sido construídas sem autorização da União e dentro do perímetro não edificável, previsto no artigo 214 da Constituição do Estado da Bahia.
O processo aponta também que o próprio município de Porto Seguro promoveu, desde 1989, a ocupação irregular da orla marítima, autorizando que fossem erguidas barracas de praia com até 700 metros quadrados de área total coberta, incluindo a construção de almoxarifado, dispensa, palco coberto, vestiário, refeitório para funcionário, quiosques de apoio e deck. “Contudo, a prefeitura não tem poderes para autorizar a construção de edificações em área da União, em áreas de proteção permanente, ou em áreas tombadas, sem que as obras sejam analisadas e autorizadas pelos órgãos competentes, como o Ibama e o Iphan”, justificou o MPF.
De acordo com o Ministério Público, a barraca Axé Moi, por exemplo, tem sido notificada desde 1995 pelo Iphan e o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), que emitiram vários embargos, chegando, inclusive, a aplicar multas contra as construções irregulares.
Os proprietários do empreendimento, no entanto, relatou o MP, teriam ignorado as medidas e continuaram investindo no crescimento do negócio. Isto, mesmo após uma decisão liminar da própria Justiça, que havia barrado novas alterações na construção até o fim do julgamento do processo.
Quanto à barraca “Tôa-Tôa”, teve, em 94, uma única autorização do Iphan para a construção de 192 metros quadrados. Mas, teria ultrapassado os limites estabelecidos e, hoje, conta com uma estrutura de mais de 6 mil metros quadrados. O complexo de lazer teria sido construído, basicamente, sem a licença dos órgãos competentes, conforme o MPF. Por causa disso, desde 1996, o empreendimento tem sido alvo de autos de infração por “supressão da vegetação de restinga” e chegou a ser acionado pelo próprio Iphan, em 2007.
Donos recorrem
No início dessa semana, os proprietários dos complexos de lazer, juntamente com representantes do município de Porto Seguro, recorreram da decisão no Supremo Tribunal Federal (STF). Em nota, o dono da Axé Moi, Beto Nascimento, que também é vice-prefeito daquela cidade, afirmou ter ficado surpreso com a determinação.
“Isso [a decisão judicial] coloca em risco o turismo de Porto Seguro e vai destruir o ganha-pão de milhares de pais e mães de família, colaboradores, ambulantes e fornecedores. Com a falta de turistas, os hotéis também serão afetados, o desemprego irá aumentar e as consequências para a população serão as piores possíveis”, ressalvou Beto Nascimento.
O proprietário do Tôa–Tôa, Paulo Onishi, é vereador em Porto Seguro e também se manifestou sobre o assunto. “Toda a cadeia econômica local sofrerá forte impacto, caso a decisão do juiz federal de Eunápolis seja mantida no STF”, disse, em entrevista ao jornal A Tarde.
“Raio X”:
Com uma área de 20 mil metros quadrados e 200 metros de praia (descrita em seu site), o Axé Moi possui diversos bares, além de restaurantes e lanchonetes. A estrutura conta com 1.500 mesas, seis mil cadeiras e mil sombreiros. O complexo de lazer ainda tem 48 banheiros construídos em granito, com água corrente e dispõe de tendas para cobertura na praia.
E no Axé Moi, o lema bem que poderia ser a música de Ivete Sangalo “E vai rolar a festa, vai rolar…”. No local, as noites nunca são monótonas. Sempre tem shows. Os eventos por lá acontecem o ano inteiro: Luau do Axé Carnaporto, Reveillon Axé Moi, Outubro Folia, Axé Porto e shows nas temporadas de Julho, Outubro e Janeiro.
Já o Tôa-Tôa cita em sua página na internet que tem uma estrutura de 4 mil metros quadrados (e não 6 mil, como afirmou o MP) e também desponta como point de turistas e veteranos, sediando luaus regados a muita música, durante todo o ano.
Bahiatursa teme impacto negativo sobre o turismo
A Superintendência de Fomento ao Turismo (Bahiatursa) também enviou nota, falando sobre o polêmico assunto. A Bahiatursa diz reconhecer a relevância das barracas para atrair turistas para a região e entende que a ação vai provocar um grande prejuízo com o esvaziamento da paisagem, além de desfavorecer o entretenimento local.
“É bom lembrar que estamos em meados do mês de setembro, bem próximos do início da alta estação. Tanto o trade turístico local como os gestores públicos não terão tempo hábil para planejar uma nova imagem e reverter o impacto que esse episódio terá no fluxo turístico do período”, justificou o superintendente da Bahiatursa, Diogo Medrado.