Marco Wense*
Ninguém, pelo menos em sã consciência, pode desdenhar da necessidade de uma reforma na Previdência, sob pena de não ter dinheiro para pagar quem já é aposentado e, muito menos, quem vai se aposentar.
O que é inadmissível é o esfolamento do cidadão-eleitor-contribuinte. Isso mesmo: querem, impiedosamente, arrancar não só a pele como também a alma.
A culpa de toda essa desastrosa situação decorre da irresponsabilidade dos senhores governantes. Os últimos presidentes da República se acovardaram diante de imprescindíveis reformas, além da previdenciária, a política e a tributária.
No entanto, eles, os políticos, com as honrosas e pouquíssimas exceções, parecem insensíveis. Passam a impressão, ou melhor, a constatação de indiferença, de desprezo pelo ser humano.
Não se brinca com a dignidade das pessoas, um dos fundamentos mais importantes do Estado Democrático de Direito, previsto no artigo 1, inciso 3, da nossa Lei Maior.
É incrível, mas é a pura verdade: vivemos um salve-se quem puder sem precedentes na história política da República, que mais parece uma republiqueta. É cada um cuidando de si ou do seu grupo.
É o corporativismo a serviço da impunidade. Agora mesmo, já transitando em regime de urgência, um projeto na Câmara dos Deputados para liberar a farra dos partidos com o dinheiro do fundo partidário.
Ora, o dinheiro do fundo partidário é público. Se os deputados querem gastar o nosso dinheiro como desejam, sem prestação de contas, que façam uma vaquinha entre eles. Aí, fica tudo liberado, até mesmo para comprar gravatas e ternos italianos.
A escandalosa proposta acaba com a possibilidade do TSE de punir as legendas que não apresentam ou tenham a prestação de contas anual rejeitada.
Se não querem prestar contas ao órgão máximo da Justiça Eleitoral, imagine ao filiado, digamos, canela seca. Só quem vai saber da gastança do dinheiro meu, seu, enfim, do povo brasileiro, são as cúpulas partidárias, os donos das legendas.
Pois é. Enquanto o cidadão comum vive o dilema de como vão ser seus benefícios, os deputados criam regras para se aposentar a partir de apenas um ano de mandato, através do chamado PSSC, que é o Plano de Seguridade Social dos Congressistas.
Como não bastasse essa mais nova sabedoria, consta também no projeto de lei a “eternização dos diretórios provisórios”, como disse o ministro Gilmar Mendes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Ora, ora, essas famigeradas comissões provisórias são instrumentos ditatoriais a serviço dos que se acham proprietários dos partidos. São assentadas no manda quem pode, obedece quem tem juízo.
A provisoriedade de uma comissão tem que ter um tempo determinado para que se transforme em diretório. Do contrário, passa a ser sinônimo de mandonismo, de negação da democracia e afirmação do autoritarismo.
Entre os muitos provérbios populares, um já foi escolhido pelos senhores parlamentares: farinha pouca, meu pirão primeiro. E assim caminha a humanidade e também a política.