Marcos Bandeira lança livro e traz revelações sobre menores em conflito com a lei


Entrevista mostra posicionamento sobre processos envolvendo menores


Marcos Bandeira: “muitos conseguiram interromper a trajetória criminosa e compreenderam a grande possibilidade que é a vida”

O advogado e professor Marcos Bandeira, com uma experiência de 28 anos como juiz, inclusive na Vara da Infância e Juventude de Itabuna, lança quinta-feira (16) o livro “O adolescente em conflito com a lei – Do ato infracional à execução de medidas socioeducativas”.

Publicada pela Editus – Editora da Universidade Estadual de Santa Cruz), a obra será apresentada no auditório do Hospital de Olhos Beira Rio, às 18h45min. É a quinta publicação na carreira do autor, fruto da dissertação de mestrado em Direito na UFBA.

Bandeira, um dos fundadores da Academia de Letras de Itabuna, leciona no curso da Direito da Uesc e explica que o livro tem um caráter interdisciplinar. Porque aborda temas como educação, contexto social e econômico, evolução histórica dos direitos infantil, juvenil, bem como uma pesquisa empírica envolvendo o adolescente, seus pais ou responsáveis, além dos diversos profissionais que trabalham na execução das medidas socioeducativas em meio aberto.

O público-alvo do livro é a comunidade acadêmica (estudantes, professores não só da área de Direito, mas Pedagogia, Psicologia, Assistência Social, História etc), além de advogados, juízes, promotores, defensores públicos e todos aqueles que trabalham com o adolescente infrator e a execução das medidas socioeducativas.

Ao Diário Bahia, ele mostrou posicionamentos que são frutos de pesquisas e da experiência como magistrado na área que trata especificamente das questões envolvendo menores.

 

Sua experiência como juiz da Vara da Infância e Juventude lhe dá que olhar sobre a proposta de redução da maioridade penal?

O meu olhar como magistrado da infância e juventude da Comarca de Itabuna, que fui por quase 20 anos, que o adolescente infrator é um sujeito na peculiar condição de desenvolvimento e que ao cometer um ato infracional precisa obter uma resposta sancionatória do Estado, que tenha um caráter retributivo, mas sobretudo pedagógico. É preciso que exista uma equipe interdisciplinar. A resposta meramente jurídica é inócua e insuficiente. Na opinião dos bons doutrinadores que labutam nessa área, a redução da maioridade seria um retrocesso, pois encheria os presídios de jovens que poderiam ter outras oportunidades, mas que seriam facilmente cooptados pelos chefes de facções e traficantes. Certamente ao saírem do presídio ingressarão nas carreiras criminosas com mestrado e doutorado em Direito e contribuirão para aumentar a violência no Brasil. Além do mais, a redução da maioridade penal é inconstitucional, pois fere cláusula pétrea da Constituição Federal.

Nota avanços no processo de ressocialização de menores em conflito com a lei?

O que posso dizer é que nos últimos quatro anos tivemos um retrocesso visível nessa área. O CONANDA – Conselho Nacional dos Direitos da Criança – foi desmontado e vários programas de execução de medidas deixaram de funcionar ou funcionaram precariamente sem observar os preceitos da sócioeducação previstas na Lei do SINASE – Lei 12.594/2012. A medida socioeducativa é uma política pública, que visa precipuamente interromper a trajetória criminosa do jovem e ao mesmo tempo criar as condições necessárias para inserir ou reinserir o adolescente no sistema de garantias de Direitos, incluindo ele no sistema educacional, no estágio remunerado ou mercado de trabalho, além de fortalecer os vínculos familiares e comunitários. O grande desafio de todos os operadores de Direito é evitar que esse jovem que está em dificuldade ingresse no sistema penal.

 Das histórias reais que acompanhou, há um número expressivo de menores que superaram os conflitos com a lei? Ou são minoria?

Hoje não tenho dados precisos, mas na época da minha pesquisa empírica, que faz parte do meu livro, fiz várias entrevistas com adolescentes e familiares, que contam histórias de superação de muitos deles, que deram a volta por cima e hoje já são pais de família e estão inseridos no mercado de trabalho. É verdade também que na longa caminhada alguns foram mortos violentamente por facções criminosas ou pela própria polícia, e outros acabaram ingressando no sistema penal, mas o importante é que muitos conseguiram interromper a trajetória criminosa e compreenderam a grande possibilidade que é a vida.

Como avalia o papel da família num cenário em que o menor está imerso em conflitos?

O papel da família é fundamental no processo de execução da medida socioeducativa, seja em regime fechado, semiaberto ou aberto. Quando a equipe interdisciplinar visita a família e passa a conhecer a estrutura familiar, os hábitos e crenças, tudo isso pode contribuir para que o programa socioeducativo possa determinar algumas atividades em oficinas e estabelecer metas para serem cumpridas pelo adolescente que está cumprindo medidas, de sorte que o protagonismo da família nesse processo é importantíssimo para ajudar o jovem a superar as suas dificuldades e ingressar no sistema de garantias de direitos.