Deficiente visual dá exemplo de superação e se forma em Psicologia



Geiverson
Geiverson da Silva Santana: “prefiro seguir como uma pessoa normal, sem fazer um grande alarde por causa da deficiência”

Por Evellin Portugal

 

“Com a maturidade, eu pude perceber que tenho um problema, mas não posso deixá-lo me limitar. Eu teria que vencê-lo, ter um objetivo na minha vida. Reconheço que tenho uma limitação, mas ela não pode me impedir de seguir em frente”. Foi com essa determinação que o itabunense Geiverson da Silva Santana, de 24 anos, superou a deficiência visual e se formou em Psicologia na Unime-Itabuna.

No dia 2 de fevereiro, durante a colação de grau, “Gegê” – como é carinhosamente chamado pelos amigos – foi aplaudido de pé pelas mais de duas mil pessoas que compareceram à Terceira Via Hall. “Eu percebi os aplausos e o barulho, mas não sabia exatamente o que estava acontecendo, pois não via a plateia. Quando eu desci para a cerimônia do capelo, meu irmão e minha amiga contaram o que tinha acontecido. Fiquei muito emocionado e ainda mais motivado. Compreendi que não era uma homenagem porque eu sou deficiente, mas por causa da superação que todos haviam visto ali naquele momento”, descreveu.

Durante a graduação, Gegê enfrentou alguns obstáculos, mas sempre procurava meios para vencê-los. “Senti muita falta de material apropriado para pessoas com necessidades especiais, como eu. Então não tive acesso a algumas leituras, xerox que não podiam ser ampliadas. Mas sempre compensei estudando por videoaulas e materiais que encontrava na internet, os quais eu podia ampliar. Também precisei desenvolver uma boa escuta durante as aulas e tive o apoio da turma e algumas amigas em especial, que colaboraram com o meu aprendizado e me apoiaram para que eu chegasse até o final”, contou.

Geiverson ainda revela que tinha o desejo de cursar Educação Física, mas sabia que seria difícil exercer a atividade por conta da limitação dele. Foi aí que conheceu a Psicologia e se apaixonou. “Tendo conhecimento de tudo o que a Psicologia pode fazer, hoje não me enxergo mais em outra profissão. Sei que posso ajudar outras pessoas tanto com a minha experiência, quanto com o meu aprendizado durante o curso. É uma oportunidade de fazer as pessoas enxergarem a vida de outra forma e valorizá-la”, observou.

E se engana quem pensa que ele quer parar por aqui. O plano do jovem psicólogo é ir cada vez mais longe. “Eu quero continuar estudando, fazer uma pós-graduação, me especializar na área clínica e, futuramente, fazer um mestrado. Também pretendo começar, desde agora, a atuar nessa área”, revelou.

“Olhar para frente”

A mãe de Geiverson teve rubéola. Por conta disso, ele nasceu com cegueira total. Com um ano de idade, passou por uma cirurgia, mas não deu certo. Seis meses depois, fez outra cirurgia e passou a enxergar 50% em cada olho. Aos cinco anos, ele perdeu a visão total do olho direito e o que restou do olho esquerdo foi diminuindo aos poucos. Com astigmatismo, glaucoma e catarata congênita, hoje tem apenas 12% da visão.

Para chegar até a graduação, que ele descreve como o ponto alto de todas as conquistas já alcançadas, o jovem teve que superar barreiras em todas as fases da vida, especialmente na escola. “Na infância eu sofria porque não tinha essa noção de resiliência que eu deveria ter pra poder, independente da situação, olhar pra frente e seguir. Foram muitas lutas, mas eu não podia deixar os medos me vencerem. Mesmo com todo o bullying, tinha que me relacionar com as pessoas, seguir em frente”, recordou.

Durante a entrevista ao Diário Bahia, ele narrou um momento difícil que teve que superar. “Por conta da pouca visão, eu sempre precisei que alguém ditasse para mim o que estava escrito no quadro e tinha um colega que me ajudava. Mas um dia a professora se incomodou, pegou meu pescoço, me levantou da cadeira, me levou até a frente do quadro e disse: ‘você não está enxergando? Pois agora você vai enxergar’. E enfiou o meu rosto no quadro, porque eu colocava o rosto bem próximo ao caderno. Então ela fez a mesma coisa, só que de uma forma agressiva”, relatou.

Hoje, Geiverson vence as limitações dia a dia e busca levar a vida da maneira mais normal possível. “Eu tento viver de uma forma bem leve, sem me diferenciar muito das outras pessoas. Lógico que tem algumas questões que precisam ser distintas, mas prefiro seguir como uma pessoa normal, sem fazer um grande alarde por causa da deficiência. Tenho certeza que tudo o que eu passei me ajudou a ser quem eu sou hoje, ajudou em toda essa construção para que eu chegasse até aqui”, completou.